O índice de crianças diagnosticadas com depressão infantil quase dobrou na última década. A doença saltou de 4,5% para 8% em crianças entre 6 e 12 anos, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.
Só no Brasil, estima-se que 10 milhões de meninas e meninos sejam acometidos por ao menos uma crise de depressão ao longo da juventude. Mas a questão é: como identificar um transtorno psíquico em uma criança que está em plena fase de formação da sua personalidade e em uma época repleta de mudanças e transformações?
Em entrevista à rádio Metrópole, Nadja Pinho, a psicopedagoga da Holiste, falou sobre o aumento da incidência da depressão infantil e da necessidade de se falar sobre o assunto. Para a especialista, este agravo pode estar sendo influenciado pelos novos comportamentos dos pais com os filhos, frutos da cultura contemporânea: “O ato de brincar e de interagir com outras crianças não está sendo estimulado. Em muito casos, por conta da rotina atribulada, os próprios pais incentivam o uso dos jogos eletrônicos e virtuais, para minimizar a sua ausência no dia a dia dos filhos, podendo contribuir para que fiquem isolados no mundo digital. O uso de eletrônicos em si não é exatamente o problema, mas sim a falta de brincadeiras no “mundo real” e do momento da convivência”.
Não é apenas drama juvenil
Estudos mostram que os adolescentes são biologicamente mais vulneráveis. Constatou-se que, ao longo do processo de maturação cerebral nessa etapa da vida, algumas estruturas se formam antes que outras e funcionam em ritmos diferentes entre si, deflagrando uma sintonia dissonante. Isso explica a impulsividade e imaturidade características desta fase e a dificuldade em lidar com determinadas situações.
Por isso a necessidade de uma atenção ainda maior com esse público, especialmente porque os sintomas da depressão infantil podem ser confundidos com alterações da personalidade como timidez, irritabilidade, mau humor ou agressividade e, em alguns casos os pais podem até considerar os comportamentos normais para a idade.
Segundo a psicopedagoga, “tanto a criança como o adolescente estão em fase de desenvolvimento, então são muitas as mudanças neste período. Por isso é necessária constante observação por parte dos pais e familiares, é preciso estar junto deles, não tem como perceber qualquer modificação no comportamento se não está junto, pois são mudanças singulares, cada criança e jovem irá agir de uma maneira”.
Diálogo: uma ferramenta poderosa
Ao mesmo tempo em que está sendo formada uma geração caracterizada pela ausência dos pais na rotina de seus filhos e em que os smartphones e jogos virtuais são cada vez mais presentes, já há algumas décadas que muitos pais vêm fazendo de tudo para que os filhos não tenham de enfrentar as adversidades que a vida lhes impõe. Essa combinação tem sido determinante para formar jovens inseguros, isolados e sem capacidade de resiliência e autoconfiança.
Nadja Pinho acredita que os pais e familiares devem buscar maior interação com seus filhos e estimular maior convívio interpessoal, principalmente entre as crianças, através de brincadeiras e atividades ao ar livre, deixando os games um pouco de lado. “A proibição de jogos on-line e eletrônicos não é a melhor opção. Não devemos trabalhar com o “impedir”, mas sim lidar com a situação de forma comedida, afinal os aparelhos eletrônicos fazem parte dessa geração e provavelmente farão parte na geração futura. Não devemos enxergar a tecnologia como a causadora do problema, mas ensinar a usá-la de maneira apropriada, usufruindo dos benefícios que ela pode trazer para a educação dos jovens”.
Ela ainda reforça, “o momento do diálogo tem sido perdido nas rotinas familiares e é preciso resgatar estes momentos. Saber como foi o dia, o que cada um fez, como foram as atividades na escola…tudo isso contribui para estimular a dialogicidade”, explica.
O papel dos pais neste momento, caminha no sentindo de ajudar os filhos a construir virtudes e valores, respeitar as diferenças e pedir ajuda sempre que necessário. Mesmo assim, a profissional alerta que qualquer desconfiança no padrão de comportamento daquela criança ou adolescente, o recomendado é buscar auxílio profissional. Apenas um especialista será capaz de dizer aos pais se realmente há motivo para preocupações. Entretanto, se houver presença de algum transtorno, é muito importante que o tratamento seja feito o quanto antes.