Livro debate como traumas, deficiências físicas e questões culturais pode complicar tratamento.
“O tratamento não é um pré-requisito para se sobreviver à dependência.”
Essa afirmação corajosa abre o capítulo sobre tratamentos no livro “Now What? An Insider’s Guide to Addiction and Recovery”, de William Cope Moyers, um homem que, ainda assim, precisou passar por “quatro tratamentos intensos durante mais de cinco anos” antes de se libertar do álcool e das drogas.
Filho de Judith e Bill Moyers, pais bem-sucedidos que observaram desesperadamente enquanto o filho buscava o esquecimento por meio das drogas e do álcool, William Moyers afirma em entrevista que sua batalha quase fatal contra a dependência mostra que essa “doença da mente, do corpo e da alma” não respeita status nem oportunidade.
— Meus pais me criaram para que eu me tornasse tudo o que quisesse, mas quando me deparei com essa doença crônica incurável, não consegui me libertar por conta própria.
Ele finalmente saiu do transe causado pela droga quando “parei de tentar do meu jeito” e começou a ouvir terapeutas profissionais e a assumir a responsabilidade por seu comportamento. Nos últimos “18 anos e quatro meses, um dia por vez”, ele viveu livre das drogas.
— O tratamento não é o fim: é o começo. Meu problema não era beber e usar drogas. Meu problema era aprender a viver sem beber nem usar drogas.
Moyers reconhece que o tratamento não é mágico. Mesmo depois de uma internação de um mês em um respeitado centro de tratamento como o Hazelden, em Center City, Minnesota, onde Moyers é vice-presidente de relações públicas e relações com a comunidade, a probabilidade de continuar sóbrio e limpo é de apenas 55% um ano depois.
“Desconfie de qualquer programa que ofereça 100% de sucesso. Isso não existe”, afirmou Moyers. “O tratamento trabalha para possibilitar a recuperação. Mas a recuperação também é possível sem o tratamento. Não existe uma abordagem padronizada. O que eu precisei e funcionou para mim não é necessariamente o que você e seus entes queridos precisam.”
Assim como muitos fumantes que tentam parar várias vezes antes de finalmente superar a dependência da nicotina, pessoas que dependem de álcool ou drogas frequentemente precisam tentar mais de uma vez.
Além disso, pessoas que são forçadas a se tratarem antes de estarem prontas também não têm muitas chances de recuperação. “O tratamento funciona, mas só se a pessoa quiser”, afirmou Moyers.
Contexto
Para quem precisa de um programa bem estruturado, Moyers descreveu o que acredita que possa aumentar ao máximo as chances de superar a dependência de álcool e drogas.
O mais importante é passar por uma avaliação antes de decidir pedir ajuda. Seu cônjuge também é dependente? Existem outras “doenças mentais, traumas ou deficiências físicas, influências socioeconômicas, questões culturais ou dinâmicas familiares” que possam complicar a dependência e sabotar o sucesso do tratamento?
Embora a maior parte das clínicas respeitadas faça uma avaliação completa antes de receber uma pessoa, é importante saber se o centro ou a clínica fornecem o serviço de profissionais que possam cuidar de quaisquer problemas subjacentes revelados pela avaliação. Por exemplo, existem médicos ou psiquiatras à disposição, caso isso seja necessário?
Há assistentes sociais na equipe para abordar problemas familiares, ocupacionais ou de vida? Se o dependente em recuperação for para casa e encontrar os mesmos problemas que causaram a dependência de drogas e álcool, as chances de que continue sóbrio e livre das drogas se tornam muito reduzidas.
Há algum programa voltado para membros da família que possam aprender junto com o dependente as bases da recuperação e como se preparar para voltar para casa depois que o tratamento acabar?
Por fim, o programa oferece um serviço de acompanhamento pós-tratamento? Atualmente a dependência é reconhecida como uma doença crônica que permanece indefinidamente com o dependente em recuperação. Assim como outras doenças crônicas, como o diabetes e a hipertensão, para que se tenha controle é necessário haver trabalho duro e diligência. Um escorregão não significa voltar a uma vida de abuso, e um bom programa ajudará dependentes que completaram o tratamento a lidar com desafios futuros a sua recuperação.
“A dependência é uma doença familiar”, afirmou Moyers.
Famílias sofrem quando alguém que amam desce ao purgatório da dependência. Mas ao contrário da crença de que as famílias deveriam interromper o contato com o dependente e permitir que chegue ao “fundo do poço” antes de começar a se recuperar, Moyers afirma que o fundo do poço frequentemente é a morte.
“É um engano perigoso, embora popular, a crença de que o dependente só vai parar de usar drogas quando chegar ao fundo do poço, ou seja, quando chegar a um ponto em que esteja tão desesperado que aceite ajuda por conta própria”, afirmou Moyers.
Ao invés disso, o autor pede que as famílias não abandonem seus entes queridos e mantenham abertas as linhas de comunicação, lembrando-os com frequência da disposição de ajudá-los quando e como quiserem. Contudo, ele acrescenta que as famílias precisam estabelecer limites firmes — nada de dinheiro, carros, nada que possa ser convertido no abuso de substâncias químicas.
Segundo Moyers, a despeito da melhora do dependente, “as famílias devem cuidar de si mesmas. Não podem permitir que o dependente tomasse conta de suas vidas”.
Às vezes, familiares e amigos de dependentes decidem fazer uma intervenção, confrontando-o com o que está ocorrendo e pedindo para que a pessoa busque ajuda, frequentemente fornecendo possíveis contatos terapêuticos.
“Uma intervenção pode ser a chave que interrompe o processo e permite que o dependente reconheça a extensão de sua doença e a necessidade de se responsabilizar por seu comportamento”, afirmou Moyers. Mas para que a intervenção funcione, “o doente não pode ser desprezado ou diminuído”, afirmou.
Além disso, o autor alerta as famílias a evitarem ameaças. Ele destaca que a mente de um “dependente desesperado e amedrontado” é dominada pelas drogas e pelo álcool, ficando sem lógica, empatia ou compreensão. “O dependente lida com ameaças tão mal quanto lida com pedidos emotivos e chorosos.”
The New York Times News Service/Syndicate – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.
FONTE – R7