Nessa edição do Encontros Holiste, a psiquiatra Livia Castelo Branco e a psicóloga Josefa Ferreira falaram de um tema muito importante e atual: o relacionamento abusivo.
O relacionamento abusivo é um fenômeno que pode causar sérias consequências para a saúde mental do indivíduo. Em nossa sociedade, o problema é mais comum entre as mulheres, podendo acarretar desfechos trágicos como o feminicídio.
Para tratar do tema trouxemos a psiquiatra Livia Castelo Branco e a psicóloga Josefa Ferreira, ambas do Núcleo de Sexualidade da Holiste, em mais uma edição do Encontros Holiste. Josefa abriu o evento com a palestra “Por que ficamos em um relacionamento abusivo?”, seguida por Dra. Livia com o tema “Impactos emocionais de um relacionamento abusivo”.
“É importante tratar desse tema porque ele pode ser a causa de um adoecimento mental sério. A pessoa que está sofrendo o abuso poucas vezes consegue identificar o que está acontecendo e, mesmo sofrendo, continua na relação.” – explica Livia.
Confira as fotos do evento:
O QUE É UM RELACIONAMENTO ABUSIVO?
A maioria das pessoas pensa que o relacionamento abusivo se resume aos casos que envolvem agressões físicas, o que não é verdade. Grande parte dos casos apresenta jogos psicológicos e sobrecarga emocional. O abuso pode se apresentar na forma verbal, moral, psicológica, física, sexual ou patrimonial.
O problema se estabelece quando uma das pessoas da relação utiliza do seu poder pessoal para manipular o outro: controlar a roupa que ele usa, as amizades que mantém, os lugares que frequenta, o momento de ter relações sexuais, etc.
“É importante frisar que isso acontece de um modo sutil. Aos poucos o abusador vai minando a confiança, os contatos sociais, os vínculos de amizade, passando de forma despercebida pela vítima.” – afirma Josefa.
Assista à palestra completa:
POR QUE FICAMOS EM UM RELACIONAENTO ABUSIVO?
Uma das coisas que mantém a vítima presa ao relacionamento abusivo é a sua estrutura cíclica. O relacionamento não vai mal o tempo todo; ele oscila com o tempo, o que leva a vitima esquecer os eventos ruins quando eles já não passam de uma lembrança distante.
Quatro fases compõem esse ciclo: tensão, incidente, reconciliação e lua de mel. Na tensão, o abusador cria situações para deixar a vítima ansiosa, com medo de que algo aconteça; quando a tensão sobe muito acontece o incidente, que pode ser uma agressão verbal, física, ou alguma outra atitude violenta; na reconciliação, o abusador pede desculpas, coloca a culpa no parceiro e tenta diminuir a gravidade do incidente; uma vez reconciliados, se inicia a lua de mel, a fase da calmaria onde o abuso é esquecido e se tem a ideia de fortalecimento da relação.
“Além disso, muitas mulheres possuem um histórico familiar parecido, e acabam normalizando a relação abusiva. A violência muitas vezes é confundida com cuidado, amor e carinho. Mesmo quando descobrem que estão sendo abusadas, elas sentem vergonha e culpa pela situação, mantendo-se afastadas dos amigos e familiares e presas no discurso do abusador.” – explica a psicóloga.
PERFIS MAIS VULNERÁVEIS
Algumas pessoas possuem maior vulnerabilidade em ficar em um relacionamento abusivo. São condições que estão relacionadas à personalidade ou história de vida do indivíduo. Pessoas com dificuldades financeiras, com pouco suporte social (família, amigos, colegas de trabalho), com comportamento impulsivo e/ou dependente, que possuem sintomas depressivos ou transtornos de personalidade.
“Esses fatores favorecem a manipulação por parte do abusador, pois a vítima se vê sozinha, impotente de analisar a situação, reagir ou mesmo pedir ajuda. É claro que pessoas que não possuem esse perfil podem ser vítimas de um relacionamento abusivo, e muitas vezes a gente pode estar no papel do abusador, também.” – pontua Livia Castelo Branco.
Assista a palestra completa:
IMPACTOS EMOCIONAIS
Um relacionamento abusivo pode trazer impactos emocionais importantes para a vítima. Isolamento, tristeza, ansiedade, insônia, perda ou ganho de peso, dificuldade de concentração, abuso de substâncias e adoção de comportamentos de risco são apenas alguns exemplos, mas existem outros sintomas.
Quando a pessoa continua imersa no relacionamento e em sofrimento psíquico, existe a possibilidade de desenvolvimento de um transtorno mental mais grave, como a depressão, o transtorno de ansiedade crônica, o transtorno de estresse pós-traumático e a dependência química.
“No momento que estabelece um transtorno, é fundamental buscar ajuda especializada. Um psiquiatra ou psicólogo oferece um espaço de escuta que a vítima não encontra em seu entorno. Além disso, o profissional é capacitado para estabelecer um diagnóstico, o plano de tratamento e as ações que vão aliviar os sintomas que a pessoa vem enfrentando.” – esclarece a psiquiatra.
COMO AJUDAR ALGUÉM NESSA SITUAÇÃO?
Todo mundo já ouviu a expressão “Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. Mas, nem sempre “meter a colher” é a única ou a melhor forma de ajudar. Há outras coisas que podem ser feitas para auxiliar a vítima a se livrar de uma relação abusiva.
“Primeiro, é preciso oferecer um espaço de escuta e acolhimento daquela pessoa, sem julgamentos. Você não precisa intervir diretamente na relação do casal; às vezes você pode se oferecer pra cuidar do filho de alguém para que ela possa resolver algum problema ou simplesmente aliviar o estresse.
Se uma mulher sofre agressão física, por exemplo, você pode simplesmente oferecer um lugar para ela ficar uns dias. E, o mais importante: encaminhar a pessoa para um acompanhamento profissional especializado.” – finaliza Livia.