A “Saúde Mental na Terceira Idade” é o tema oitavo vídeo da série Desmistificando a Saúde Mental. Nossa equipe fala sobre as especificidades dos transtornos mentais em idosos, cuidados, tratamentos e possibilidades de uma vida mais plena.
Participam do vídeo os psiquiatras André Gordilho e Victor Pablo, a psicóloga Raissa Silveira e a terapeuta ocupacional e coordenadora do Núcleo da Terceira Idade, Michelle Campos.
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UMA POPULAÇÃO GRISALHA
O Brasil está ficando grisalho. Segundo dados do IBGE, entre 2012 e 2017, o pais passou a ter mais de 30 milhões de idosos, o que equivale a 14% da população brasileira. Um crescimento de quase 20% em 5 anos. A expectativa é que em 2050 esse número supere os 60 milhões, o que equivalente a 30% de toda população, colocando o Brasil como um dos países com grande população idosos do mundo.
“Esse fato torna fundamental investigar e produzir conhecimento em relação ao fenômeno do envelhecimento e a peculiaridades da saúde do idoso”, destaca a psicóloga Raissa Silveira.
Envelhecer é um processo inevitável, que acontece em todas as dimensões do ser humano: na cronológica, biológica e psicossocial. É caracterizado principalmente por uma diminuição orgânica e funcional do indivíduo, mas que não decorre de um processo de adoecimento.
Até mesmo doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, que muitas vezes acompanham o envelhecimento, podem ser controladas com o acompanhamento médico a ponto de não interferirem nas atividades diárias.
“Existe um pensamento incorreto que o envelhecimento está associado ao adoecimento. Mas o processo natural que esperamos é envelhecer de forma saudável, mesmo com as limitações funcionais. É possível manter a independência e autonomia, manter vínculos familiares e sociais adequados, fazer atividades físicas e até mesmo ser produtivo, que não seja trabalhando, mas mantendo-se ocupado, mesmo em um ritmo menor”, explica o psiquiatra André Gordilho.
“Mas o fato é que, em termos de saúde, o paciente idoso necessita de um olhar diferente. Exige uma maior minucia na avaliação clínica, desde exames clínicos, neurológicos à uma investigação mais intensa do histórico familiar. Existem, também, especificidades em relação ao adulto jovem; algumas doenças se manifestam de maneiras diferentes em relação aos idosos. Além disso, o metabolismo mais lento, por exemplo, pode trazer mais riscos de desenvolver efeitos colaterais ou pequenas alterações metabólicas e infecções, que não afetariam jovens, mas que no idoso pode desencadear, inclusive, sintomas psiquiátricos”, completa o psiquiatra.
TRANSTORNOS MENTAIS NA TERCEIRA IDADE
Dentre os problemas mais comuns na terceira idade estão os transtornos mentais. Acredita-se que algo entre 12,5% e 33% da população acima de 60 anos apresentam algum tipo de transtorno mental ou alterações de comportamento, sendo a depressão, os transtornos de ansiedade, as demências e o abuso de substâncias psicoativas, aqueles com maior incidência nesse público.
Transtornos de ansiedade
Estima-se que cerca de 4% na população da terceira idade sofra de transtornos de ansiedade, tais como: ansiedade crônica, transtorno obsessivo compulsivo (TOC), transtorno de acumulação e o transtorno de estresse pós-traumático.
Os transtornos ligados a Ansiedade, em sua maioria, não são incapacitantes, mas podem causar grande sofrimento. Não é incomum que o idoso tenha mantido os transtornos de ansiedade durante toda a vida sem procurar ajuda profissional, e quando chega à terceira idade o quadro já apresenta um agravamento ocasionado pelos anos de negligência.
Demência
Demência envolve um conjunto de sintomas diretamente ligados à perda cognitiva, como problemas de memória, raciocínio, linguagem e alterações de comportamento. Existem alguns tipos de demência, que podem ser separadas em dois grupos: reversíveis e degenerativas. Entre as principais estão a Doença de Alzheimer, Demência com Corpos de Lewy, Demência Vascular e a Frototemporal.
“Para cada tipo de manifestação da Demência, existe um grupo de sintomas diferentes e, consequentemente, tratamentos diferentes, além da evolução individual de cada um. Em idosos, sintomas como delírios e alucinações trazem riscos como a possibilidade de fuga do lar, quedas ou agressões, bem como comportamentos alterados com a família ou cuidadores”, comenta o psiquiatra Victor Pablo.
Ainda se discute muito sobre a prevenção da demência. Alguns estudos apontam uma forte relação entre a incidência da doença e o estilo de vida. Exercícios físicos, reeducação alimentar, evitar o tabagismo, dormir bem e estimular o cérebro são hábitos bastante recomendados nesse sentido.
Depressão
A depressão é o transtorno com maior prevalência: cerca de 7% dos idosos manifestam a doença.
“Diferente do adulto jovem, que geralmente tem os sintomas clássicos como tristeza, desanimo, perda da capacidade de sentir prazer, o idoso não se manifesta dessa maneira. O idoso começa a buscar isolamento, a se queixar de problemas físicos e apresentar déficits cognitivos, como a perda de memória”, pontua o Dr. André Gordilho.
A doença é responsável por 70% dos casos de suicídio na terceira idade. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram taxas mais altas de suicídio em pessoas acima dos 65-70 anos de idade.
“As Ideações suicidas são muito prevalentes, porém são de difícil identificação. Temos muitos casos de suicidas passivo-crônicos, onde o ato acontece de maneira lenta, não expressado de forma clara. Ele vem pela autonegligência. O idoso passa a não se alimentar direito, descuida das medicações e da higiene”, completa o psiquiatra.
SAIBA MAIS SOBRE A DEPRESSÃO
ATENTO AOS SINAIS
Muitas vezes o idoso chega no consultório depois de um caso extremo, como uma reação violenta ou em um estado avançado de debilidade.
“Mesmo nos quadros mais debilitados, o paciente apresenta melhoras assim que iniciamos as intervenções – exames clínicos, orientações medicamentosas, reconstrução de rotinas, estimulação cognitiva” pontua Dr. Victor Pablo.
É importante a família estar atenta a alterações bruscas ou que estejam muito distantes do habitual, buscando ajuda de um profissional especializado quando isso ocorrer. Dessa forma, o idoso e sua família podem ser orientados de maneira adequada e entender que não é preciso passar por esse momento de forma solitária.
“É preciso estar atento à forma que o seu familiar está lidando com tantas mudanças, por conta do envelhecimento. Muitas vezes eles não conseguem colocar em palavras o seu sofrimento, não aceitam as mudanças ou até mesmo têm a dificuldade de se perceber como uma pessoa que sofre. Devemos ficar atentos não só a questões físicas e funcionais, mas também com a qualidade subjetiva e emocional dessas pessoas”, alerta Raissa Silveira.
Um humor mais retraído, perda do interesse em coisas que geralmente davam prazer, distúrbios de sono, perda do apetite, descuido com imagem e higiene, menor capacidade de concentração e memória, são alguns indicadores que algo não vai bem.
“A ideia que o idoso tem que ser reclamão, que tem que se queixar da vida, é errada. O idoso tem que levar uma vida alegre, tem que sair, encontrar amigos, família, ser produtivo. Quando a pessoa passa a reclamar demais, alguma coisa está errada. Esse talvez seja o primeiro ponto a chamar atenção para buscar ajuda, principalmente na saúde mental”, completa Dr. André Gordilho.
CUIDADOS E TRATAMENTOS
Existe uma gama de doenças diferentes que demandam tratamentos específicos. Os pilares básicos são o tratamento medicamentoso, psicoterapia, atividade física e estimulação cognitiva. Porém, alguns pacientes precisam de intervenções mais pontuais e intensivas.
Internação Psiquiátrica
A grande maioria dos pacientes chega quando a situação de saúde já está bem agravada, onde ele já não consegue realizar nada, com uma mudança de humor muito acentuada. Nesses casos a internação psiquiátrica é o tratamento mais recomendado.
Na internação, o idoso é inserido em uma rotina de cuidados médicos e terapêuticos realizado por uma equipe de profissionais multidisciplinares, com formas de estímulos diversas, respeitando sempre a individualidade e as limitações de cada paciente.
“O espaço terapêutico da internação traz um contexto de convivência, com possibilidades de construção de vínculos e laços sociais. Ele participa das atividades terapêuticas – musicoterapia, arteterapia, terapia ocupacional – e grupos de fala, onde há uma identificação com o grupo e, ao mesmo tempo, um trabalho para desenvolver a autonomia”, explica a Raissa Silveira.
SAIBA MAIS SOBRE A INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA PARA TERCEIRA IDADE
Hospital Dia
Um hospital dia de Saúde Mental é um centro de reabilitação psicossocial para pessoas com limitações funcionais decorrentes de transtornos mentais.
“Ao paciente que não tem indicação para a internação integral, tem o Hospital Dia, onde você passa o dia realizando atividades terapêuticas que têm como objetivo estimular o paciente de diversas formas, seguindo um projeto individualizado que contempla as necessidades dele. Uma grande vantagem é que, pelo fato de ser um centro, existe a criação de vínculos e laços sociais”, sugere Dr. André Gordilho.
SAIBA MAIS SOBRE O HOSPITAL DIA
Estimulação cognitiva
É comum pacientes com sofrimento psíquico apresentarem um declínio cognitivo. São pacientes com dificuldades de memória, atenção, raciocínio, linguagem ou funções executivas.
“Inserir essas pacientes em um programa de treino, de estimulação ou reabilitação cognitiva vai trazer inúmeros benefícios, contribuindo diretamente na ampliação da autonomia e execução de tarefas diárias”, explica Michelle Campos.
SAIBA MAIS SOBRE A ESTIMULAÇÃO COGNITIVA
SEMPRE HÁ TEMPO PARA O CUIDADO
O trabalho com o idoso deve buscar, sempre, o aumento da autonomia e independência, mesmo diante das suas limitações e perdas. O Desafio é criar estratégias, dentro do ambiente familiar, que permitam uma maior qualidade de vida.
“Muitas vezes as famílias e os próprios idosos chegam com uma desesperança em relação a esse momento que estão vivendo, como se não houvessem possibilidades, como se fosse, de fato, o fim. Temos que enxergar que no processo de envelhecimento existe vida e existe possibilidades, tudo vai depender do investimento – orientações e estímulos – que vamos realizar em conjunto com a família e com o idoso.
É preciso compreender que é um momento que faz parte da vida, mas não é um momento carregado apenas de perdas e incapacidade. É possível novos horizontes, outra configuração, uma participação social que é diferente, mas que pode ser ativa. Tudo isso são elementos que vão proporcionar, a esse idoso e essa família, uma maior qualidade de vida”, conclui Michelle Campos.