Agenda sua consulta
Agende sua Consulta

Transtornos mentais crônicos | vídeo

ivia-castelo-branco-encontros-holiste1

Ainda pouco compreendidos e, talvez por isso, muitos estigmatizados pela sociedade, os transtornos mentais crônicos consistem em quadros que precisam ser tratados com cuidado, olhando a pessoa não apenas como um doente, mas alguém que tem capacidades, sentimentos e, principalmente, possibilidades de viver bem.

Na palestra “Lidando com pacientes crônicos”, a psiquiatra Livia Castelo Branco falou sobre o tema, abordando aspectos como o que configura e o que ocasiona uma cronificação, quais as consequências desse quadro para o paciente, família e sociedade, e quais as formas de tratamento.

Assista a palestra completa:

CARACTERÍSTICAS

A doença mental crônica é caracterizada pela pelo seu caráter persistente. Mesmo quando tratado, o quadro crônico já não responde tão bem às diversas terapêuticas, inclusive aos medicamentos, deixando o paciente sempre com a presença de algum sintoma.

Entre os transtornos mentais, existem os transtornos do neurodesenvolvimento (como autismo, retardo mental), que são essencialmente crônicos – o paciente já nasce e passa a vida com aquela doença. Existem outros transtornos mentais que aparecem ao longo da vida e que também se relacionam diretamente com aspectos neurológicos, mais relacionados ao desgaste dessas estruturas, tal qual as síndromes demenciais como o Alzheimer e a demência frontotemporal. Além disso, transtornos mentais mais comuns, como esquizofrenia, transtorno bipolar, depressão, transtornos de ansiedade, transtorno obsessivo compulsivo (TOC), podem se tornar crônicos com o passar dos anos, devido a tratamentos tardios, negligenciados ou outras condições do quadro.

“Então, no final das contas, a maioria dos transtornos mentais pode cronificar, ou seja, pode ser uma doença que vai ficar bastante tempo na vida da pessoa. O que a gente faz é tratar para que a pessoa melhore e para que ela viva normalmente. Em alguns casos vai ter cura, outros casos não, mas tratamos para que a pessoa viva bem com aquela doença”, destaca Livia Castelo Branco.

 

COMO OCORRE A CRONIFICAÇÃO

São diversos os fatores que podem ter influência para que uma doença mental se torne crônica. Alguns deles são de base genética, outros estão relacionados à história de vida da pessoa – se ela teve mais traumas, por exemplo -, outros tem a ver com a personalidade do indivíduo, como ele lida com fatores estressores ao longo da vida.

“Tudo isso vai influenciar na gravidade do transtorno mental. Mas, uma coisa que é muito importante é a adesão irregular. Ou seja: o paciente que não faz o tratamento adequado, é prescrito o medicamento e ela não toma de forma adequada. Isso faz com que a doença se torne cada vez mais grave e precise de doses cada vez mais altas de medicação”, explica a médica.

Em alguns casos ocorre um processo de refratariedade, ou seja, o paciente não responde ao tratamento como esperado, o que pode estar associado a diversos fatores, como a gravidade daquele quadro ou até mesmo a forma do organismo metabolizar o medicamento.

“Tem gente que toma dipirona para uma dor e aquilo é como água, precisa de algo mais forte – isso também acontece nos transtornos mentais. Então, dependendo da forma que a pessoa metaboliza aquelas medicações, se age muito rapidamente e sai do corpo, isso pode acontecer”, completa.

A psiquiatra destacou, ainda, o problema da desassistência em saúde mental no Brasil, que se relaciona com vários aspectos, desde a falta de estratégias para esses pacientes até o preconceito, que muitas vezes leva a desistência do tratamento.

“Também temos uma questão que vem ocorrendo nos últimos anos que é o fechamento dos hospitais psiquiátricos. Existe uma luta antimanicomial – e sabemos realmente que o modelo assistencial anterior era inadequado, no sentido de que não se dava um tratamento individualizado para aquele paciente -, mas o que ocorreu foi  o fechamento dos hospitais sem que houvesse uma estratégia que funcionasse fora do hospital psiquiátrico”, diz.

 

REPERCUSSÕES DO TRANSTORNO MENTAL CRÔNICO

Os casos de transtornos mentais crônicos muitas vezes estão associados a uma redução das atividades diárias e do auto-cuidado. A pessoa deixa de trabalhar, não consegue mais produzir da mesma forma, deixa de ir ao mercado, manter a higiene, ligar para um parente no dia do aniversário, gerir as suas finanças e muitos outros aspectos do dia-a-dia que terminam prejudicados. Isso leva a prejuízos nas relações sociais e familiares, em função de sintomas como irritabilidade, agressividade e pouca participação nas tarefas diárias.

Livia Castelo Branco destaca que é muito comum o descuido com a saúde em geral. Os pacientes não conseguem manter os cuidados clínicos e deixam de realizar exames de rotina, consultas, levando a um agravamento das doenças que carregam.

“Tudo isso gera uma dificuldade muito grande na autonomia do paciente. Ele já não tem condições de trabalhar, tem dificuldade de gerir as finanças e a casa e de cuidar de sua saúde e higiene. Ele começa a precisar de mais cuidados. A família muitas vezes pode demonstrar reações como raiva, medo ou vergonha por comportamentos inadequados. Assim, pode ocorrer a segregação social, com as pessoas próximas se afastando”, alerta a médica.

Muitas vezes esses pacientes se tornam vulneráveis a golpes e acidentes, por perderem a noção de perigo. Em função da agressividade, que também é consequência dos problemas mentais, pode ocorrer episódios de violência gratuita, viver em situação de rua, além de suicídio e overdose nos casos relacionados à dependência química.

“Os transtornos mentais também reduzem a expectativa de vida. Uma pessoa que fuma, tem sua expectativa de vida reduzida de 8 a 10 anos, mas quando falamos de depressão, reduz de 7 a 11 anos, ou seja, semelhante ao tabagismo. A esquizofrenia reduz de 10 a 20 anos, e a dependência química mais ainda, por conta dos problemas clínicos relacionados”, pontua a especialista.

 

EVOLUÇÃO DAS DOENÇAS

Normalmente, as doenças mentais crônicas apresentam um surto inicial, depois a tendência é se manterem estáveis, mas pode haver uma piora lenta e progressiva. Por exemplo: casos demenciais são doenças progressivas. Então, a tendência é que se agravem ao longo do tempo.

Podem ocorrer, também, episódios de agudização, um período de piora, que com o tratamento volta a melhorar. Esses episódios vão ocorrer com ou sem fatores desencadeantes, que podem ser alterações de medicação, fatores emocionais (como a perda de alguém amado), algum problema social, abandono, questão financeira, uso irregular da medicação ou, ainda, a própria doença com seus altos e baixos.

 

TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR

O tratamento, de forma geral, considera em primeiro lugar a assistência multidisciplinar. Neste ponto, a psiquiatra enfatiza que o remédio é uma parte do tratamento, mas não funciona sozinho.

“Além dele, é importante o acompanhamento terapêutico, que é um profissional especializado que vai estar ao lado do paciente nas atividades do dia-a-dia, como autocuidado, higienização e solução de problemas. Também há a terapia ocupacional, que aborda questões específicas, como dificuldades motoras, cognitivas, de memória, ajudando a organizar a rotina da pessoa. Em alguns casos, é importante a fonoaudiologia para sanar dificuldades de fala, deglutição, mastigação, além da fisioterapia”, explica.

Outro ponto essencial é a psicoterapia, que ajuda no autoconhecimento, fazendo com que a pessoa descubra porque se comporta daquela forma, quais são os gatilhos que a levam a se sentir pior, como lidar com seus problemas e se colocar de outras formas. A atividade física também faz parte do tratamento, além de cuidados básicos com a qualidade de vida – dormir bem e se alimentar de forma balanceada.

Há estudos científicos que apontam que isso diminui a atividade inflamatória, melhora a qualidade cardiovascular, previne diversas doenças e, além disso, melhora o estresse”, sublinha a psiquiatra.

ASSISTA AO VÍDEO: RESIDÊNCIA TERAPÊUTICA E MORADIA ASSISTIDA

 

OBJETIVOS

O objetivo das intervenções em primeiro lugar é a redução de sintomas, e o medicamento é muito importante para combater sintomas como insônia, agressividade, ansiedade, tensão, alucinações (auditivas e visuais), entre outros.

O tratamento também se volta para a melhora dos comportamentos disfuncionais e o estimulo à individualidade e independência. O aperfeiçoamento de capacidades também faz parte, por meio da terapia ocupacional, percebendo quais são os talentos da pessoa e estimulando.

“O objetivo é mostrar que dentro daquele indivíduo existem histórias, preferências e gostos que podem ser bem explorados. Quando a gente fala no tratamento de um transtorno mental crônico a gente não está falando de um fim de linha, e sim de um novo olhar para um novo momento de vida, em que a gente vai estimular as capacidades da pessoa e olhar aquele indivíduo de outra forma, para que ele tenha a melhor qualidade de vida possível”, finaliza Livia Castelo Branco.