A psiquiatra Fabiana Nery realizou a palestra “Como podemos fazer melhor? Construindo novos paradigmas no tratamento da esquizofrenia” no World Congress on Brain, Behavior and Emotions 2017 em Porto Alegre (RS).
O Brain é um congresso de prestígio mundial, que reúne palestrantes nacionais e internacionais e realiza debates multidisciplinares entre cientistas e clínicos, abordando temas da neurociência, assim como temas comportamentais.
O evento aconteceu no período de 14 a 17/06 e discutiu o tema “Inovação para entender os rumos da Neurociência”. Dra. Fabiana Nery falou para uma plateia de 800 pessoas, formada principalmente por neurologistas e psiquiatras, onde discutiu a evolução do conceito e do tratamento da esquizofrenia na história recente da psiquiatria.
Confira o resumo da palestra.
COMO PODEMOS FAZER MELHOR?
Novos objetivos no tratamento da esquizofrenia.
A descrição clássica da esquizofrenia foi cunhada no início do século XX. Inicialmente Kraepelin, na 8ª e última edição do seu livro Tratado de Psiquiatria, descreve o quadro de Demência Precoce como “a perda da unidade interna das atividades do intelecto, da emoção e da volição”. Alguns anos mais tarde, em 1911, Bleuler propôs o termo Esquizofrenia como um conceito aperfeiçoado da Demência Precoce descrita por Kraepelin. Esta visão da Esquizofrenia como uma patologia profundamente deteriorante e incapacitante descrita no início do século passado, permanece até os dias atuais. Mesmo após o advento dos antipsicóticos na década de 1950, que sem dúvida mudaram de forma dramaticamente positiva o curso dessa patologia, a associação entre Esquizofrenia e incapacidade permanece, como por exemplo nas descrições de 1968 da 2ª edição do DSM que considera o paciente esquizofrênico como “um paciente incapaz de atender as demandas da vida diária”, e mesmo atualmente, na edição mais recente do DSM em 2013 onde a esquizofrenia é associada a “significativa disfunção social e ocupacional”.
Mas o mundo mudou muito nos últimos 100 anos, neste período acompanhamos uma revolução tecnológica, com dispositivos que são capazes de fazer e receber ligações, enviar e-mails, reproduzir músicas e organizar nossas agendas, tudo isso com o tamanho de um relógio de pulso, da mesma forma pudemos ser testemunhas da mudança da matriz energética, antes representada quase que exclusivamente por combustíveis fósseis e atualmente observamos a utilização cada vez maior de fontes de energia renováveis e não poluentes como a energia eólica e a solar.
Sem dúvida muita coisa mudou nos últimos 100 anos, e os objetivos do tratamento da esquizofrenia também mudaram. Para uma abordagem mais eficiente da esquizofrenia, precisamos entender o tratamento dos paciente portadores de esquizofrenia de uma maneira mais abrangente, partindo desde a promoção da saúde e a prevenção de fatores associados ao aumento da incidência, passando pelo diagnóstico precoce e adequado, possibilitando assim a escolha e início do tratamento medicamentoso eficaz, até a promoção da adesão do paciente ao tratamento. Mas tão importantes quanto estas etapas apresentadas até agora, é tentar promover o retorno funcional desse paciente e como consequência reintegra-lo socialmente e devolver ao indivíduo sua autonomia, neste sentindo, questões como psicoeducação e envolvimento dos familiares no tratamento tornam-se questões fundamentais para a obtenção de metas mais sofisticadas no tratamento do paciente portador de esquizofrenia.
Dentro deste novo paradigma no tratamento da esquizofrenia, surge o conceito de Superação. Superação não é necessariamente o desaparecimento de todos os sintomas observados na patologia, mas sim a obtenção de metas significativas para a vida daquele paciente, com o objetivo final de atingir a reintegração social e recuperação funcional daquele indivíduo. O conceito de superação tem haver com superar obstáculos e vencer desafios e esse deve ser o objetivo maior do tratamento de pacientes portadores de esquizofrenia e não apenas a remissão ou redução dos sintomas.