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O bêbado e o equilibrista | Artigo Pablo Sauce

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O psicólogo Pablo Sauce traz uma outra perspectiva sobre os aprendizados e desafios no tratamento do “alcóolatra” no artigo “No descompasso entre o bêbado e o equilibrista”, publicado no jornal A Tarde.

Confira o artigo completo.


“Quem conversa com poste é bêbado” (Jair Bolsonaro)

O recente período eleitoral do Brasil manifestou uma polarização ideológica, sintetizada na frase: “Nós ou eles”, posição discursiva segregativa de tudo que não lhe é semelhante. Nas palavras de Caetano: “É que Narciso acha feio o que não é espelho”. De um lado, a exigência em legitimar e perpetuar determinado modus operandi, por mais abusivo que seja. Do outro lado, a voz imperativa que, encarnando a Ordem, diz: “Pare! Não mais do mesmo!”, sem outra pretensão a não ser normatizar os diferentes modos de satisfação, deixando na “ilegalidade” os possíveis excessos e particularidades de cada um.

A tensão produzida por esta redução aos contrários, da convivência entre (im)pares na realidade social brasileira, aproxima-se do jogo de forças que convive na realidade psíquica “alcóolatra”. Nela, evidenciamos a presença de duas vertentes opostas: uma pura exigência de satisfação sem limite e uma pura exigência de privação da satisfação. A primeira encarna a voz coercitiva que instiga a beber mais do mesmo, a despeito das evidentes consequências danosas. A segunda, por sua vez, encarna a voz imperativa que diz: “Pare! Não mais do mesmo!”.

Chegando a este ponto de inflexão, dois lados da mesma moeda, o “bêbado” não tem outra saída senão jogar a dita moeda para o ar e decidir entre cara ou coroa: ou fica entregue ao uso abusivo, ou consente ao imperativo “Pare!”. Aparente beco sem saída, a suspensão de decisão, neste ponto de inflexão, permite instaurar o lapso de tempo necessário para a abertura de um espaço inédito que possibilite dar mais um passo no percurso.

Nessa instância da condução do tratamento de um “alcoólatra”, encontramo-nos na posição de aprendizado sobre como conversar com um poste, sem perder a sobriedade. Trata-se do momento de virada da posição subjetiva, onde o “alcóolatra” terá conseguido abrir mão do recurso à substância como bengala, o que lhe permitia manter-se em equilíbrio para lançar mão de outros recursos aos quais apoiava-se em sua caminhada pela corda bamba que amarrava seu corpo, mente e ambiente.

Trata-se de inaugurar e sustentar a possibilidade de uma nova perspectiva que faça exceção à regra, em suas duas vertentes de exigência de satisfação: a coercitiva do sem limite e a imperativa da privação. A possibilidade de sucesso do tratamento reside em amarrar a corda que enlaça três instâncias –corpo, mente e ambiente – mantendo-a esticada na medida necessária e suficiente para cada caso, ao tempo em que encorajamos nosso herói a seguir adiante sem sua bengala para, só depois, ele conseguir desamarrar-se dos Nós que ele mesmo criou e que o assujeitam ao passado. De sua sobriedade, dependerá que faça de um poste obstáculo ou baliza.

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Artigo publicado no jornal A Tarde, 23 de janeiro

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