No cuidado em Saúde Mental, uma eficiente comunicação terapêutica faz uma grande diferença na recuperação do paciente. Entender os sinais que a doença nos dá pode salvar vidas.
Muitas vezes, o transtorno mental se apresenta de forma multifacetada; noutras, pode estar ocultado pelos próprios aspectos da doença ou de outros quadros clínicos. Existe, ainda, a possibilidade de traços fortes de personalidade dificultar o estabelecimento de um diagnóstico preciso. Cabe ao profissional de saúde mental saber ler estes sinais, essa comunicação emitida pelo paciente, para entender rapidamente o quadro da doença. Para tratar desse tema o Dr. Luiz Guimarães, psiquiatra da Holiste, ministrou o treinamento “Comunicação Terapêutica, Relacionamento Terapêutico e Recursos Terapêuticos”, parte do Programa de Treinamento Holiste, que tem o objetivo de atualizar constantemente nossa equipe de enfermagem, terapeutas, técnicos e cuidadores.
Comunicação: a boca fala, o corpo fala e, inclusive, o silêncio
Para abordar um tema tão complexo, o psiquiatra iniciou sua fala esclarecendo que comunicação não se apresenta apenas na fala, principalmente no paciente psiquiátrico, mas através de um rico sistema de sinais que envolvem toda e qualquer forma de expressão do paciente. Ritmo, volume, energia, pausas, gestos, silêncios, negativismos, comportamento evasivo, agressividade, resistências, enfim, uma série de aspectos permeiam o processo comunicativo e devem ser objeto de atenção do especialista.
“O paciente com doença mental quase sempre apresenta problemas para expressar o que está acontecendo, isso faz parte dos sintomas. Muitas vezes é realmente difícil expressar com palavras o que está acontecendo em seu íntimo, e por isso é tão importante o trabalho da escuta especializada de um terapeuta. Da mesma forma, sinais corporais podem dizer muito sobre aquela pessoa. Alguém que não consegue ficar muito tempo parado, concluir um raciocínio, dá sinais de que pode estar passando por um episódio de estresse, mania ou hiperatividade. Alguém que permanece em silêncio durante uma conversa, que não emite sua opinião nem tem desejo de falar com ninguém, pode estar passando por um episódio depressivo. São estes sinais, são estas informações que precisam ser analisadas durante o tratamento” – esclarece o psiquiatra.
Mas a relação entre estes fatores pode não ser tão direta, e mais de uma característica pode ser encontrada no mesmo paciente, o que demanda um olhar ainda mais apurado do especialista: “O paciente pode ter uma personalidade manipuladora, pode conseguir dissimular bem os sintomas mais visíveis de seu transtorno e o profissional tem que estar apto a identificar esse comportamento. Você pode ter um paciente depressivo que está acelerado, por exemplo, por conta de uma angústia muito grande. A comunicação é multifatorial, é preciso verificar aquilo que vem do paciente, comparar com seu histórico e com as informações que a família fornece, para que haja maior segurança na leitura dessas mensagens”.
Comunicação Terapêutica
A comunicação do profissional com o paciente deve atender alguns princípios básicos, que vão nortear esse diálogo e permitir que as questões rujam e sejam trabalhadas da melhor forma. Dr. Guimarães cita quatro pontos importantes dessa comunicação profissional: flexibilidade, eficiência, propriedade e resposta.
“Flexibilidade é tentar se colocar no lugar do outro, compartilhar o lugar de fala, deixar que o paciente sugira um assunto, permitir sua expressão. Eficiência é fazer com que aquela comunicação cumpra com o seu objetivo, que é ser uma ferramenta terapêutica; muitas vezes os pacientes podem começar a divagar muito sobre determinada questão, necessitando que o profissional direcione a conversa, faça novas perguntas, assuma o controle da situação. Propriedade é estar preparado, seguro de que pode atender aquela demanda do paciente; quando o especialista se deparar com um assunto que não domina, manter essa comunicação a base de improviso pode ser arriscado e deixar o paciente inseguro. Por fim, a resposta é justamente aquilo que vai dar conforto e confiança ao paciente, seja ela positiva ou não; o paciente vai perceber que foi ouvido, que foi entendido, e que tem alguém cuidando de sua demanda”.
Estabelecimento do vínculo
Talvez seja este o principal objetivo da comunicação terapêutica: o estabelecimento do vínculo terapêutico. É fundamental que entre o profissional da saúde mental e o paciente exista um vínculo de confiança, de cuidado, uma relação mútua de respeito que irá nortear todas as ações terapêuticas, principalmente no paciente psiquiátrico que, geralmente, tem a sua capacidade de crítica abalada pela doença.
Contudo, o psiquiatra ressalta alguns pontos importantes sobre a construção do vínculo: “É o paciente quem define quem, quando e como vai estabelecer o vínculo. Ele é quem vai ser cuidado, quem estar em uma situação desfavorável nessa relação. Muitas vezes o paciente vai fazer esse vínculo com o seu médico; noutras, com a enfermeira ou com o psicólogo. Para o estabelecimento do vínculo, existem alguns pontos que devem ser destacados: mantenha o canal de comunicação com o paciente sempre aberto, esteja disponível para conversar, nunca prometa algo que não poderá cumprir, saiba dar o não e explica o motivo da negativa, prefira sempre falar a verdade ao seu paciente, deixando claro o seu papel, a sua função no tratamento” – finaliza.