Impulsividade, inquietude e desatenção, sintomas associados ao TDAH (Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade), podem ser o resultado de um mau funcionamento do circuito de recompensa do cérebro, segundo um estudo publicado na revista PLOS ONE.
Já foi demonstrado que, em indivíduos sem o transtorno, a liberação de dopamina, neurotransmissor ligado ao prazer e à satisfação, está relacionada não ao efetivo recebimento de uma recompensa, mas à sinalização de recompensa.
Durante a vida, somos estimulados por recompensas, mas, principalmente, por pistas de que essa recompensa virá diz Paulo Mattos, um dos autores do artigo, professor de psiquiatria da UFRJ e coordenador de neurociências do Idor (Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino).
Utilizando a técnica de neuro imagem funcional, que permite a ativação de áreas do cérebro durante a realização de uma tarefa, o estudo, feito em colaboração com colegas japoneses, comparou 14 adultos jovens com diagnóstico de TDAH que não recebiam medicação com um grupo controle de 15 pessoas.
Os participantes foram apresentados, no experimento, a uma série de estímulos visuais e lhes foi ensinado que determinado estímulo estaria associado a uma recompensa pequenas quantidades de dinheiro, no caso.
Nas pessoas com TDAH, não houve ativação do núcleo estriado, região cerebral ligada ao circuito de recompensa e de grande concentração de dopamina, durante os estímulos. Ao final do experimento, no entanto, quando o portador do transtorno era informado de que havia recebido o dinheiro, a região era ativada.
O resultado foi uma surpresa. Esse padrão anômalo já havia sido verificado em camundongos, mas nunca demonstrado da forma como o fizemos, diz Mattos.
A explicação é que o circuito de recompensa do cérebro, predominantemente dopaminérgico, funciona de modo deficitário em pessoas com TDAH.
O esquema todo pode ser resumido da seguinte forma: a falha na liberação da dopamina em resposta à sinalização da recompensa, presente em quem tem TDAH, resulta em um padrão de ativação anormal do núcleo estriado, parte da circuitaria de recompensa do cérebro, quando a recompensa não é contínua ou imediata. Em decorrência disso, esses indivíduos manifestam certos comportamentos, como a falta de atenção e a hiperatividade, os quais são interpretados, na clínica, como sintomas do TDAH.
Luis Rohde, professor do departamento de psiquiatria da UFRGS, diz que o mérito do estudo é mostrar um possível componente biológico na circuitaria cerebral que poderia explicar a aversão de pacientes com TDAH à demora ou à espera.
Segundo Mattos, o artigo tem suas maiores implicações no tratamento psicoterápico destinado aos portadores do TDAH. Nosso trabalho mostra, por exemplo, que a terapia cognitivo-comportamental, a mais indicada nos casos de TDAH, precisa passar por um ajuste fino em alguns pontos, já que ela é baseada na ideia de recompensa, diz.
Rohde vai na mesma direção.
O estudo mostra por que é importante haver pequenos reforçadores constantes nesses pacientes, porque eles precisam ter um reforçador real. A simples antecipação da recompensa não ativa a maquinaria cerebral que é ativada naqueles que não possuem TDAH.
FONTE – Folha de São Paulo