Para eles, no entanto, isso não justifica atitudes de Alex Siwek.
Ataque de pânico pode levar a atitudes irracionais e pouco coerentes.
O estudante de psicologia Alex Siwek, que atropelou o ciclista David Santos de Souza e jogou seu braço em um córrego em São Paulo, pode ter sofrido um ataque de pânico circunstancial e momentâneo, capaz de levar a atitudes irracionais e pouco coerentes, afirmaram psiquiatras ouvidos pelo G1.
O ataque não caracteriza um transtorno mental e pode acometer qualquer pessoa em situação de estresse extremo, como por exemplo dentro de um elevador em queda ou durante um terremoto, ressalta o psiquiatra Luiz Vicente Figueira de Mello, supervisor do Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da USP, ligado ao Hospital das Clínicas.
O psiquiatra avalia existirem principalmente dois tipos de pânico: o transtorno ou síndrome do pânico, que se caracteriza por crises frequentes de ansiedade e medo, com ou sem fatores que causem seu surgimento, e o pânico situacional, que pode acometer pessoas comuns diante de ameaças, acidentes ou catástrofes.
“Tomar uma atitude irracional em um quadro de pânico é muito comum, como reagir a um assalto, por exemplo. As pessoas às vezes tomam medidas que elas mesmas desconheceriam”, pondera Mello. “São atitudes reflexas em situações críticas.”
Sem justificativa
Tanto Mello quanto o psiquiatra forense Guido Palomba, no entanto, concordam que um ataque de pânico não é capaz de justificar as atitudes de Siwek. O estudante apresentava sinais de embriaguez na hora do acidente, segundo laudo do Instituto Médico Legal (IML). Testemunhas disseram ter visto o carro do jovem andando em zigue-zague na Avenida Paulista. Após atingir o ciclista, às 5h30 do domingo (10), ele deixou o local sem prestar socorro.
“Pode ser uma reação primitiva, de pânico, sim. Mas isso naturalmente não desculpa o comportamento, não justifica. Tudo isso [o pânico] pode nascer de um pensamento inicial do motorista de não socorrer”, afirma Palomba. “Se ele [Siwek] tivesse socorrido, talvez ele não tivesse sofrido o pânico que sofreu. O pânico é o tributo que ele pagou, a consequência por não ter agido corretamente.”
Para o psiquiatra forense, cada pessoa reage de uma maneira diante de situações extremas, mas há um comportamento comum aos casos: o estreitamento da consciência e a adoção de atitudes instintivas, feitas quase sem pensar. “Existe uma descarga de adrenalina junto com o estreitamento de consciência na hora do pânico”, diz.
“Em vez de colocar a mão na cabeça e pensar: ‘o que eu fiz?’, a pessoa tem uma reação primitiva, insintiva de pouca crítica”, ressalta Palomba, referindo-se às atitudes de Siwek – após atropelar um ciclista, ele deixou o amigo que estava no carro com ele em casa e foi à Avenida Doutor Ricardo Jafet, na Zona Sul de São Paulo, onde jogou o braço do atropelado em um córrego.
Provavelmente foi nesta condição pouco racional que o estudante de psicologia, após o atropelamento, dirigu-se a uma base da PM no Jardim da Saúde, também na Zona Sul, pedindo aos policiais para ser preso por acreditar que havia matado uma pessoa, analisa o psiquiatra forense.
Três atitudes
Mello explica que há três atitudes mais comuns diante de situações que causem pânico, como um assalto ou um acidente: paralisia, fuga ou enfrentamento. “Geralmente o enfrentamento ocorre quando você não tem opção”, detalha. Para o psiquiatra, “a atitude dele [Siwek] parece ter sido de pânico e fuga”.
Palomba discorda quanto à fuga. Ele acredita que, na hora do acidente, o motorista não teve pânico ou choque – este estado mental pode ter ocorrido depois, quando viu o braço preso em seu carro. Segundo o advogado de Siwek, o jovem ficou atordoado na hora do acidente e, em um primeiro momento, não viu o membro pendurado no veículo.
“Acho que a bebida alcoólica o levou a cometer esse crime de trânsito, a não ajudar o ciclista”, diz o psiquiatra forense. “Se não houvesse o braço pendurado, se o carro estivesse só um pouco amassado, ficaria por isso mesmo. Tudo nasce desta cena, ali ele [Siwek] viu que o negócio era muito grave.”
Imaturidade
Outra hipótese para a reação de Siwek é uma grande imaturidade, diz o especialista do Hospital das Clínicas da USP. “Uma pessoa imatura não julga estas situações de forma coerente, ela entra em pânico e acaba cometendo uma coisa pior ainda”, ressalta.
Mello recorda o incêndio de Santa Maria ao falar sobre situações que causam pânico. “Em um incêndio em uma danceteria, ficar em pânico pode ser um fator de vida ou morte”, reflete. O desespero pode fazer com que as pessoas se atrapalhem e não consigam sair do local em chamas.
“Em um assalto, por exemplo, o melhor é ter uma reação de paralisia do que de enfrentamento”, pondera o psiquiatra.
Na opinião de Palomba, o acidente se deveu em grande parte ao uso de álcool. Ele, no entanto, considera que a bebida não deve ter influenciado a reação do motorista após o atropelamento. “Isso tudo deve ter ocorrido quando ele estava mais sóbrio”, diz o psiquiatra forense.
Mello pondera que só uma análise do histórico do rapaz e uma avaliação psicológica podem dizer se o estudante sofre de algum transtorno mental. “Não se pode julgar o comportamento da pessoa de forma transversal”, afirma. “Precisa ver comportamento dela na infância, a forma que evoluiu.”
Como ocorreu o acidente
Na descrição da polícia, o motorista Alex Siwek estava dentro de um Honda Fit ao lado de um amigo quando o acidente ocorreu. O braço direito do ciclista foi amputado por estilhaços de vidro do pára-brisa e permaneceu preso ao veículo.
O motorista fugiu do local, deixou o amigo em casa e depois foi à Avenida Doutor Ricardo Jafet, de onde lançou o braço em um córrego. Depois, voltou à própria casa, guardou o carro na garagem e dirigiu-se a pé à unidade policial para se entregar.
O exame clínico apontou que o motorista havia ingerido bebida alcoólica antes do acidente. A comanda de consumo de Alex Siwek, paga na casa noturna de onde ele saiu antes de atropelar o ciclista, mostra que ele pagou por três doses de vodca e um energético. O horário que a comanda individual de consumo foi fechada, às 6h, porém, é posterior ao horário do acidente, ocorrido às 5h30.
O advogado de Siwek, Pablo Naves Testone, afirma que o estudante de psicologia não tem antecedentes criminais e que reúne os requisitos para responder ao processo em liberdade. Diz ainda que a família do rapaz está muito assustada com a repercussão do caso e que já sofreu ameaças.
“Acharam o número da residência fixa, e ligaram falando bobagens, como a mãe e o pai educaram o menino, falando que iam matá-los.” A ligação foi atendida pela mãe de Alex, que, segundo o advogado, está tomando rémedios por conta dos últimos acontecimentos. “Todos estão comovidos, sabem que foi aterrorizante, e que o menino será julgado pelo que fez, mas algumas pessoas estão exagerando.”
O estudante foi transferido para o Centro de Detenção Provisória 3 de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, na terça-feira (12). Ele estava no CDP 2 do Belém, na Zona Leste, desde segunda (11). Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), Siwek ficará em regime de observação, sem contato com os outros presidiários, para se adaptar ao regime carcerário. Durante o período, ele só poderá receber visita de seus advogados.
FONTE – G1