“Dieta moderada e exercícios físicos são os melhores guardiões da saúde”, já alertava o médico inglês John Hill, que em meados do século XVIII publicou talvez o primeiro guia prático para se viver mais, numa época em que passar dos 40 anos era uma raridade. “Bom humor e complacência vão prevenir metade das doenças em idosos e curar muitas outras”, acrescentava Hill. Trezentos anos depois, novas pesquisas vêm refinando os antigos métodos, mostrando a importância e a forma de se combater as inflamações crônicas, os radicais livres, a baixa imunidade e a agressão ao DNA. Em linhas gerais, a fórmula básica continua a mesma; o mais difícil, segundo especialistas, é convencer as pessoas a aplicá-la.
— O maior obstáculo é provavelmente a disciplina. Lutar contra tanta má influência que nos rodeia é muito difícil — diz o clínico geral Mike Moreno, autor do recém lançado livro “O plano de 17 dias para manter-se jovem”.
Não são poucas as tentativas de convencimento. Basta olhar as estantes das livrarias e notar o número de opções atraentes com as novas fórmulas para atingir o antigo desejo de prolongar a vida. A maioria reflete uma tensão que rodeia as atuais pesquisas visando à longevidade: a influência dos genes (ou ontogenética) contra a do estilo de vida e do ambiente (epigenética).
— A genética é o inimigo final, não podemos lutar contra ela. Mas se focarmos em coisas simples como dieta, exercícios físicos, hidratação, suplementos e vitaminas básicas, podemos certamente lutar contra o processo de envelhecimento — defende Moreno.
A Humanidade, sem dúvida, está vivendo bem mais do que na época de Hill. Em 2010, a expectativa de vida do brasileiro já atingiu os 73,4 anos.
— Longevidade é um conceito ancião, com o perdão do trocadilho… Desde que o homem é homem, que adquiriu consciência da morte, preocupa-se em viver o quanto mais — comenta Ian Victor Silva, chefe do laboratório de biologia celular do envelhecimento da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e cientista do Instituto de Estudos de Envelhecimento e Longevidade da Universidade do Texas. — Mas podemos dizer que o aumento no entendimento celular e molecular do processo de envelhecimento teve grande avanço só no último quarto do século passado.
Comer ‘bem’ é item obrigatório de manuais
Para o pesquisador, novos métodos terapêuticos, melhor diagnóstico de doenças e a ajuda da engenharia, com as próteses, reduzem os prejuízos da velhice. Já como prevenção, comer bem faz parte de todos os manuais. Mas este “bem” mudou significativamente ao longo do tempo. Hoje, a dieta mediterrânea tem sido mais valorizada: peixe, azeite de oliva e castanhas estão no grupo de gorduras benéficas; grãos integrais, frutas e vegetais no de antioxidantes, fibras e carboidratos bons.
Enquanto que, apesar de o livro de Hill — “The Old Man’s Guide to Health and Longer Life” (O guia do idoso para a saúde e a longevidade, em tradução livre), relançado pela British Library — ter muitas semelhanças com os conselhos modernos, ele não escapa de exageros curiosos: “abacaxi, a mais saborosa das frutas, é a mais perigosa” ou “cenouras devem ser evitadas, pois nenhum estômago velho pode digeri-lo”.
Nada muito diferente da atualidade, critica jornalista Lauren Kessler, que resolveu testar boa parte das muitas receitas de juventude e, obviamente, escrever mais um livro: “Counterclockwise” (Sentido anti-horário).
— Como mulher de meia-idade numa cultura de valores da juventude, eu parei para pensar no significado da idade, o que me abriu o olho para a enorme diferença entre a idade cronológica (nascimento) e a biológica (a idade do corpo) — contou Lauren, que se ofereceu como cobaia da ciência. — Quando eu li que cientistas acreditam que 70% do envelhecimento biológico pode estar sob controle, eu fui fisgada.
Atitude diante da vida é o grande segredo
Depois da maratona de cremes, dietas, treinamentos e procedimentos, Lauren revela o segredo: “ser fisicamente ativo é vital para a saúde; o que nós comemos ou deixamos de comer, também”. Soa familiar? Mas ela vai além: “Um hora de ginástica não é a resposta. E sim integrar atividades na nossa rotina, em cada parte de nossas vidas”; e acrescenta que culturas longevas têm uma dieta a base de plantas e ficam longe dos industrializados.
— Mas a chave para se tornar mais jovem é a própria atitude diante da vida. Manter um senso de curiosidade, uma sensação de que a melhor coisa poderia estar na próxima esquina; buscando desafios, assumindo riscos. Isto é o que nos mantêm jovens — conclui.
É o que defende a professora da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh, Hilary Tindle, no livro lançado recentemente nos EUA “Up: How Positive Outlook Can Transform Our Health and Aging” (Para cima: como uma perspectiva positiva pode transformar a saúde e o envelhecimento).
— Nossa personalidade influencia a saúde em todas as fases da vida. Crianças mais pessimistas, por exemplo, são mais propensas a desenvolver depressão. Mais adiante, adultos que costumam ser mais irritados, hostis, cínicos, podem desenvolver pressão alta e calcificação das artérias coronarianas, o maior preditor do ataque no coração — garante a pesquisadora.
Envelhecimento
Inflamação crônica
O corpo começa a declinar aos 20 anos. Inflamações crônicas levam a doenças cardíacas, diabetes e câncer. Fumo, sobrepeso e estresse pioram o quadro, lembra Mike Moreno.
Glicosação
Processo que une moléculas de açúcar e de proteínas, enrijecendo os órgãos. Reduzir o açúcar ajuda.
Estresse oxidativo
Células danificadas por radicais livres (moléculas do mau metabolismo do oxigênio que agridem o DNA). Alimentos antioxidantes, com peixes, castanhas, chás, são a melhor forma de combatê-los.
Atividade do DNA
A chamada metilação aumenta ou diminui a ação do DNA. Falta de ácido fólico é uma razão para o possível desequilíbrio.
Imunidade
A baixa imunidade abre a porta para doenças. Exercícios físicos, não fumar e até lavar as mãos têm seu papel.
Positividade
Prestar atenção nos pensamentos recorrentes e tentar mudá-los quando são muito negativos, defende Hilary Tindle.
Genética
Estilo de vida contribui para evitar a morte por algumas doenças, como cardíacas, antes dos 65 anos. Depois, a longevidade dos seus antepassados serve para espelhar o quanto o indivíduo pode viver, diz Ian Victor Silva.
Homens x mulheres
O processo de envelhecimento é diferente: além da capacidade reprodutiva do homem durar mais do que a da mulher, são elas as mais longevas. Não só porque elas se cuidam mais, mas por fatores ainda desconhecidos do genoma.
Teorias
Há teorias de como o nosso corpo envelhece. Acúmulo de doenças, de radicais livres, finitude da renovação de tecidos do corpo são as principais. Outra, do evolucionista Richard Dawkins, diz que os seres vivos seriam “escravos” de seu material genético. “Temos muito o que esclarecer para podermos consolidar uma ou outra teoria do envelhecimento”, diz Ian Victor Silva.
FONTE – O Globo