Estudos britânico e dinamarquês revelam tendência em países do primeiro mundo.
NOVA YORK. Um novo estudo revelou que os percentuais de demência entre pessoas com mais de 65 anos na Inglaterra e em Wales, caiu cerca de 25% nas duas últimas décadas, de 8,3% para 6,2%, uma tendência que, segundo os pesquisadores, estaria se repetindo em todos os países desenvolvidos e que pode ter um grande impacto social e econômico para as famílias e a sociedade.
Um outro estudo recente, conduzido na Dinamarca, revelou que pessoas de 90 anos que responderam a um teste de habilidade mental em 2010 pontuaram bem melhor do que os que tinham 90 anos e fizeram o mesmo teste uma década antes. Um quarto dos que foram estudados em 2010 marcaram a pontuação máxima – o dobro daqueles testados em 1998. O percentual dos mais prejudicados caiu de 22% para 17%.
O estudo britânico, publicado nesta terça-feira na “The Lancet”, e o dinamarquês, divulgado na semana passada na mesma revista, vai na contramão de previsões mais alarmistas segundo as quais o envelhecimento da população acarretaria um percentual mais alto de pessoas com demência e um custo crescente para o seu tratamento.
Especialistas dizem que os estudos confirmam algo de que eles suspeitavam há tempos: que os percentuais de demência cairiam e a saúde mental seria cada vez melhor à medida em que a população crescesse de forma mais saudável e com mais acesso à educação. As descobertas podem contribuir ainda mais para convencer as pessoas de que parar de fumar, por exemplo, entre outras medidas, pode reduzir consideravelmente o risco de problemas cardíacos e derrames.
Epidemiologistas há muito constataram que a incidência de demência é mais baixa entre os que têm mais anos de estudo, bem como entre os que mantêm a pressão arterial e o colesterol baixos. Como algumas demências são causadas por pequenos derrames e outros danos vasculares, faz sentido que os grupos que controlam esses fatores de risco tenham uma queda nos percentuais de problemas mentais. Vários estudos anteriores já haviam apontado nesta direção mas apresentavam problemas metodológicos que acabaram por lançar questionamentos sobre as descobertas.
Cientistas dizem que os dois novos estudos reúnem as mais fortes evidências de que seu palpite estava certo. Dallas Anderson, especialista em epidemiologia da demência do Instituto Nacional do Envelhecimento (maior financiador da pesquisa sobre demência nos EUA), afirma que os novos estudos trazem “evidências fortes e rigorosas”. Para ele, o mesmo deve estar ocorrendo nos EUA, embora estudos ainda sejam necessários para confirmar a tendência.
– A notícia é maravilhosa – diz P. Murali Doraiswamy, especialista em Alzheimer da Universidade de Duke, que não participou dos novos estudos. Isso significa, diz ele, que a ideia de que cada geração tem os mesmo risco para demência é falsa.
Os novos estudos oferecem esperança em meio a uma onda de notícias ruins sobre Alzheimer e demência. Grandes estudos com novas drogas para tratar o Alzheimer falharam. E uma recente projeção baseada na premissa de que os percentuais de demência permaneceriam estáveis apontou que o número de pessoas com o problema iria dobrar nos próximos 30 anos nos EUA, bem como o custo para o tratamento. Autor da previsão, Michael D. Hurd, disse que suas previsões terão que ser revistas se as mesmas tendências se confirmarem no país.
Mas a vice-presidente de relações médicas e científicas da Associação do Alzheimer, Maria Carrillo, disse não estar convencida de que as tendências possam se repetir nos EUA. Segundo ela, a pesquisa britânica não é muito acurada e o estudo dinamarquês reflete o fato de que as pessoas naquele país são mais saudáveis do que nos EUA.
Os estudos falam sobre demência, o que inclui o mal de Alzheimer, mas também outras condições, como miniderrames, que causam uma deterioração das funções cognitivas. Diretor da divisão de comportamento e pesquisa social do Instituto Nacional do Envelhecimento, Richard Suzman, disse que não é possível saber pelos novos estudos se o Alzheimer está se tornando mais ou menos prevalente.
– Outras formas de demência podem estar caindo e o Alzheimer subindo – pondera.
Os pesquisadores britânicos, liderados por Carol Brayne, do Instituto de Saúde Pública de Cambridge, se baseou num grande estudo que, entre 1984 e 1994 testou para demência 7.635 pessoas com 65 anos ou mais, selecionadas aleatoriamente na Inglaterra e em Wales. Entre 2008 e 2011, os pesquisadores testaram novamente um grupo selecionado aleatoriamente de pessoas que viviam nas mesmas regiões.
– Usamos o mesmo número, na mesma área geográfica e os mesmos métodos – explicou Carol.
Maria Carrillo questiona a acurácia dos números porque muitas pessoas se recusaram a participar do estudo e outras pessoas tiveram que ser convocadas. Ou seja, essas pessoas poderiam ter problemas e o resultado final ser diferente. Os pesquisadores dizem que levaram isso em conta e que não houve distorção do resultado.
No estudo dinamarquês, Kaare Christensen, da Universidade do Sudeste da Dinamarca compararam a saúde física e o funcionamento mental de dois grupos de dinamarqueses idosos. O primeiro foi composto de 2.262 pessoas nascidas em 1905 que foram testadas quando estavam com 93 anos. O segundo reuniu 1.584 pessoas nascidas em 1915 e testadas quando estavam com 95 anos.
Os pesquisadores apontaram quantos pontuaram bem, quantos apresentaram alguma demência e quantos entre um e outro. A curva foi totalmente revertida entre os que nasceram em 1915, segundo o estudo.
Segundo Christensen, o seu estudo, ao lado do britânico “provê uma base para o otimismo, ainda que cautelosa”. Mas, acrescenta, os estudos não são capazes de indicar como prevenir a demência nas idades avançadas.
– Meu palpite é de que não há uma única coisa, mas uma série de ações indo na direção correta – afirma Christensen.
Para Anderson, as notícias são boas:
– Com os dois estudos, estamos começando a ver que cada vez mais pessoas terão chances maiores de chegar a idades avançadas sem danos cognitivos, adiando a demência ou mesmo evitando-a. É uma perspectiva feliz.
FONTE – O Globo