Sentimento associado a situações negativas é útil contra injustiças e na conquista de metas.
RIO – Não é politicamente correto sentir raiva, emoção que vem junto com irritação, briga, punhos fechados e rosto franzido. Mas novos estudos defendem que a raiva serve como um combustível contra situações de injustiça ou para perseguir metas. O difícil é direcionar, em vez de descarregar: ter raiva da pessoa certa, na dose e no tempo certos, usando essa energia para resolver a questão de forma construtiva. É tão difícil que semana passada até o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, perdeu a cabeça e recomendou, sem motivo aparente, que um jornalista fosse “chafurdar no lixo”. Logo depois a assessoria de imprensa do STF se desculpou, alegando que o ministro estava cansado e com fortes dores no corpo.
— A raiva está diretamente ligada ao estresse, mas é preciso lidar com ela a nosso favor, com assertividade — acredita a psicóloga Marilda Lipp, diretora do Instituto de Psicologia e Controle do Estresse e autora de dois livros sobre raiva.
Ação responsável contra o medo
No Brasil, de 1.800 pessoas pesquisadas em 1986, 32% eram afetadas pelo estresse. Em 2011, o mesmo estudo foi feito com 2.000 pessoas e o índice subiu para 35%. E a raiva com isso?
— Ela acompanha o estresse: 90% das pessoas com raiva apresentam também alto nível de estresse — diz Marilda.
A psicóloga criou uma espécie de conduta que chama de ação responsável. Primeiro, a pessoa deve se perguntar se esse comportamento (com raiva) é o que quer usar. Depois, precisa analisar se a atitude vai conseguir resolver o problema sem criar outros.
— Numa explosão de raiva a pessoa se sente poderosa, mas os outros ficam com medo, se afastam — diz. — Quem consegue ter o controle da situação não se expõe tanto, fica à frente dos demais.
Para o psicanalista Theodor Lowenkron, professor de Psiquiatria da UFRJ e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), sentir raiva é normal, e só precisa de tratamento, quando passa a prejudicar o desempenho ou convívio do indivíduo.
— Nem sempre é preciso superar a raiva, às vezes a vivência desse sentimento é importante — diz.
Pessoas com raiva são mais otimistas
Em estudo da Universidade de St. Andrews, no Reino Unido, a pesquisadora Nicole Tausch observa que a raiva tem importância vital em movimentos sociais. “Em contextos políticos, a raiva sinaliza que os indivíduos ainda se sentem conectados e representados por aquele governo”, escreve.
Em outro estudo, citado na revista britânica “New Scientist” , a pesquisadora Jennifer Lerner, da Universidade de Harvard, reuniu informações sobre os sentimentos e atitudes de cerca de mil americanos, jovens e adultos, apenas nove dias após os ataques de 11 de setembro de 2001.
Nos anos subsequentes ela continuou acompanhando essas pessoas e descobriu que aquelas que sentiram raiva eram mais otimistas sobre o futuro que as que ficaram com medo dos ataques. Em laboratório, ela viu que os “raivosos” tinham uma resposta biológica menor que os “medrosos” em termos de pressão sanguínea e níveis de hormônios ligados ao estresse.
De acordo com a psicóloga Marilda Lipp, do outro lado da raiva está a depressão. Num término da namoro, por exemplo, quando uma das partes embute a raiva, geralmente fica magoada.
— É assim: a pessoa termina um namoro, sente muita raiva mas acha que não deve sentir, afinal de contas quem terminou tem o direito de não querer mais. Mas aquilo fica dentro da gente como uma raiva enrustida que vira depressão — explica ela, que alerta que o excesso de raiva tem mais a ver com infarto. — Estudos com pessoas infartadas mostram que houve muita raiva nas 48 horas anteriores ao episódio — conta Marilda.
FONTE – O Globo