A relação das pessoas com a música está sendo alterada na atualidade? Esse é o questionamento trazido pela musicoterapeuta Nadja Pinho em artigo publicado no jornal A Tarde.
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Hoje, uma ampla gama de informações está disponível na palma da nossa mão, através dos smartphones. A indústria fonográfica não ficou fora dessa série de mudanças. Atualmente, aplicativos como o Spotify e Deezer disponibilizam qualquer tipo de música, de milhares de artistas do mundo inteiro, com o simples apertar de um botão.
Esse bombardeio de informações, vindo dos aplicativos, parece interferir em nossa relação com a música; ela passa a ser ofertada como um simples produto de consumo, nos fazendo refletir se ela ainda toca os sujeitos do mesmo modo que outrora. Muitas vezes, a relação entre o ouvinte e a música acontece de um modo onde já não há espaço para subjetivações.
Na contramão dessa superficialidade, o trabalho com a musicoterapia objetiva resgatar o som particular de cada um, como um elemento terapêutico que possibilita pensar, associar, reconstruir e, muitas vezes, inventar uma história a partir das nossas memórias sonoras. Entendemos a música como um elemento comunicador que ultrapassa a barreira da língua, já que muitas vezes não se entende a letra ou a mensagem de uma canção, mas, ainda assim, ela sensibiliza por sua melodia e ritmo.
A musicalidade transforma o som em símbolos, podendo se configurar como uma forma de expressão para fatos e ideias por vezes inacessíveis pela consciência. Esses símbolos sonoros são elementos de comunicação não verbal, passíveis de serem transcritos no processo terapêutico. Nessa direção, Maristela Smith chega a afirmar que, na musicoterapia, chega-se à realização de uma obra de arte simbolizadora, social e produtiva.
Por meio de atividades sonoro-musicais, estimula-se a criatividade, a capacidade física, mental e sociocognitiva. O tratamento musicoterápico auxilia diretamente no resgate da identidade sonora do paciente. Em momentos de grande dificuldade da expressão verbal, pode ser através da música que comunicamos nossos pensamentos e emoções.
É interessante observar que apenas uma nota musical, ou um som do ambiente, pode representar para nós a identificação de uma situação. Podemos reconhecer, através de somente uma tonalidade, o disparo de um rojão, um canto de um pássaro, uma risada, o som do sino da igreja, uma buzina. Isso ocorre pela caracterização que aquela frequência representa no nível mental, sendo um potencial recurso terapêutico.
Será que hoje conseguimos sentir a nossa sonoridade? Ao andar, falar, comer, até mesmo o nosso coração batendo: ainda nos escutamos? Nesse ritmo de vida cada vez mais acelerado, como dar espaço para entrar em contato com nosso íntimo, com nosso som interior? Será que estamos nos servindo do potencial terapêutico que todas essas músicas trazem? Ou estamos utilizando esse potencial pela via banal do consumo?